Associação de vasos cerâmicos e ossos de animais: ritual funerário ou resto de cozinha em populações do passado provenientes da região nordeste do Brasil?
Resumo
Estudos desenvolvidos em sítios arqueológicos no nordeste brasileiro têm evidenciado elementos ósseos e dentários animais, e conquiliológicos, associados a estruturas funerárias humanas, assim como, a outros vestígios indicadores de processos culturais, tais como, artefatos líticos e cerâmicos, indicando variados e complexos rituais fúnebres. Nesta região existem evidências dessas associações homem-animal que apresentam variadas cronologias, indo de mil a nove mil anos antes do presente (BP). Durante anos de pesquisa em diferentes estados da região Nordeste, foram encontrados e recuperados muitos vestígios bioculturais. Neste trabalho são apresentadas as urnas funerárias classificadas como pertencentes à tradição Aratu, resgatadas em um sítio conhecido como Água Vermelha, localizado na Reserva Indígena Caramuru Paraguaçu, no estado da Bahia, onde foram registradas associações entre os artefatos cerâmicos e os ossos de animais, dispersos e modificados intencionalmente, incluindo os adornos (contas de colar), evidenciando emprego em contextos fúnebres. Os métodos analíticos macroscópicos adotados corresponderam aos protocolos utilizados em bioarqueologia humana, zooarqueologia e tafonomia com o intuito de caracterizar os tipos de estruturas funerárias, a determinação taxonômica dos vestígios faunísticos, o inventário de marcas e traços de alteração da superfície óssea, bem como, os diversos elementos contextuais contidos. Com relação à arqueofauna em particular, foi possível constatar que a presença de animais de médio porte possuíam um papel importante no âmbito funerário ao invés do que se pensava anteriormente como constituinte da dieta alimentar apenas, uma vez que apresentavam características particulares e diferenciadas se comparando com outros achados registrados em distintas áreas arqueológicas do país (marcas de polimento na epífise de osso longo depositado em um vaso cerâmico), o que resultou em ampla discussão sobre as relações entre humanos e animais nesse grupo social especificamente. Relatos antropológicos revelam a existência de rituais semelhantes pela população atual na localidade.